Antonella admirava as cores.
Ela vivia em um mundo de sonhos. Todos eles coloridos.
Quando à noite se entregava prazerosamente relaxada sob os lençóis macios e perfumados e sentia sobre seu corpo o calorzinho aconchegante logo sorria e se entregava a um sono profundo.
Dizia quem a visse assim que estava morta. Nem mesmo a respiração se ouvia. Parecia que estava fora de si mesma. E ela sabia que estava. Ali somente seu corpo ficava. Seu espírito a abandonava e ela viajava longe, no mundo das cores.
Penetrava na imensidão do céu, na escuridão, e nesta viagem vertiginosa encontrava o brilho prateado das estrelas longínquas, se aproximava do rei sol incandescente, do amarelo, vermelho e laranja das chamas e depois se extasiava com o branco da lua, com o azul da terra vista do espaço, com o amanhecer e o pôr do sol colorindo o céu numa mescla de cores sem fim que se cambiavam a cada instante. O espetáculo do verde da terra viva, do mar azul, das terras vermelha, negra, marrom e roxa recém-arada, do deserto tostado, do multicolorido das flores nos jardins, do cinza nebuloso das nuvens enfezadas, dos arranha-céus de concreto que compunham as grandes cidades.
Tudo isso visto do espaço em que flutuava, livre das amarras que a prendiam ao mundo. E nesse passeio noturno Antonella depois de mergulhar em tudo e extasiar-se com tudo despertava com um sobressalto. Parecia que de repente voltava por um acidente de viagem em choque com a matéria, seu corpo ali na cama como um empecilho, uma pedra no caminho da liberdade.
Acordava angustiada, chateada, olhava a sua volta o quarto, as quatro paredes pintadas de rosa sem graça, de seus móveis de cores inexpressivas, achava tudo tão pequeno, tão ínfimo, tão insignificante e durante todo dia ficava pensativa e amuada.
Os seus sabiam, ela não era normal, ninguém podia ser normal agindo assim, durante o dia em casa ou na escola que freqüentava em uma classe especial, só fazia pegar os seus lápis de cor e suas tintas e pintar com eles enchendo as folhas de cores e sorrindo a cada pincelada ou rabisco seu. Ela às vezes tentava dormir em sua carteira, mas a professora a acordava quando estava tentado desligar-se e partir no mundo de seu sonho colorido.
Seus pais não sabiam o que acontecia com ela, quase não falava ou se abria a boca era para falar sobre o mundo colorido, mostrando a cor de um vestido azul, e dizendo e repetindo azul, ou explorando o verde da grama do jardim e o acarinhando com as mãos, ou observando o céu azul, as nuvens brancas, mas sempre indiferente a realidade do mundo, ao que se passava.
Aquele olhar perdido que parecia estar sempre olhando e vendo não sei o quê, a fazia louca aos olhos de todos.
No seu mundo irreal Antonella um dia se perdeu.
Naquela manhã seus olhos não se abriram. Foi-se embora para sempre no mundo colorido do universo.
Seu espírito se recusou a voltar. Quando viajava no mundo de seus sonhos fugiu cada vez mais para longe de seu planeta azul, procurou um raio de sol e nele se sentou, olhando resoluta a terra não quis viajar nele até lá e ali ela ficou até se esmaecer nele.
Em casa todos choravam, ela tinha partido para sempre e a conduziram a sua última morada.
Nesta tarde chovia, um raio de sol atravessava as gotas d´água e o reflexo das cores do arco-íris no céu enfeitava e fazia sorrir a tarde.
Criado por Lavínia Ruby em 23/07/10.
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